quinta-feira, 19 de agosto de 2010

SOBERANIA DE DEUS NAS CATASTROFES

A doutrina da soberania de Deus é uma doutrina de grande importância dentro da teologia cristã, durante muito tempo a igreja reformada sustentou a forma tradicional de se entender essa doutrina, porém, percebem-se algumas arestas, que já alguns teólogos reformados têm apontado. Acredito que o maior delas é que a doutrina na sua forma tradicional invalida a responsabilidade do ser – humano para com os males que acontecem no mundo. Por exemplo: hoje temos visto fenômenos meteorológicos extremos, mais freqüentes e mais intensos, como nunca antes visto. Aí fazemos a seguinte pergunta: “De quem é a culpa”? E alguns respondem: “Deus é soberano e controla todas as coisas. Ele sabe o que faz”! Esse tipo de resposta já está ultrapassada, uma doutrina da soberania de Deus relevante é aquela que responde esse e outros tipos de perguntas que fazemos todos os dias, sem tirar a responsabilidade do homem e sem comprometer a soberania do Deus todo poderoso. Sabemos que os maiores problemas relacionado à natureza é de total responsabilidade humana, é o egoísmo humano que na verdade está destruindo todo o planeta!

A proposta de Shirley C. Guthrie no livro “Sempre Reformando”, pode ser uma grande saída para que a teologia reformada fique de uma vez por todas livre dessa tradicional doutrina especulativa da Soberania de Deus, onde apresenta um Deus que é soberano e livre para fazer o que quiser, para “amar e não amar, ajudar e recusar-se a ajudar, oferecer perdão ou exigir punição em resposta ao pecado humano, salvar e condenar” [1]. Nessa mesma perspectiva esse Deus é responsável por tudo o que acontece na terra, pois nada pode acontecer contra a sua vontade, “tudo que acontece no universo é determinado pelos incompreensíveis planos de Deus (Institutas de Calvino. 1.17.2)” [2], e, além disso, essa mesma doutrina aponta para um poder dominador e controlador de Deus, sendo Ele também responsável pela condição que cada ser humano vive na terra, exigindo que cada um permaneça na condição em que está. Dessa forma os pobres, doentes, impotentes, devem permanecer como estão, humildemente, aceitando o que Deus determinou.

Como podemos usar esse tipo de teologia em nossos dias? Ela não responde e na verdade nunca respondeu as indagações do ser humano quanto à vida. Como pode haver um Deus assim? Que faz acepção de pessoas? Que trata alguns com total desumanidade e outros com grandes regalias? Prefiro acreditar que esse Deus não existe!

Como Shirley disse: “existe, porém, outra maneira de se entender a soberania de Deus, uma maneira que o próprio Calvino conhecia, e que os teólogos reformados contemporâneos como Karl Barth, Jurge Moltmann e Daniel Migliore, têm redescoberto em nosso tempo” [3].

Podemos chamar essa doutrina de: “doutrina trinitária de Deus”, doutrina essa que entendemos o poder e a soberania de Deus através da revelação “somente em Cristo”. Que apresenta um Deus trinitário, ou seja, “Deus Pai Todo Poderoso”, “Jesus Cristo”, o seu único Filho, e o “Espírito Santo”. Nessa doutrina Deus tem liberdade em todos os eventos da vida, liberdade não para salvar ou punir, ajudar ou não ajudar, amar ou não amar. Mas, pelo contrário, liberdade somente para amar.

Dessa forma, não foi Deus que matou através do tsunami as 220 mil pessoas no sul Ásia e leste da África no dia 26 de dezembro 2004, na verdade foi o próprio homem que causou tudo aquilo, pois, a liberdade da soberania de Deus é somente para amar, mas alguém pode perguntar: se Deus realmente amava aquelas pessoas, onde estava Deus no momento da tragédia?

Creio que Ele estava naquele momento consolando os que sofriam. Creio que Ele estava agindo através dos médicos, enfermeiros, e pessoas comuns que voluntariamente ajudavam aqueles que perderam seus bens e seus entes queridos. Ao contrário do que muitos pensam e afirmam que “Deus é vingador”, às vezes usando a palavra “justo” para justificar essa idéia. Eu na verdade creio que Deus é “AMOR”, pois, a sua justiça não é para vingar, destruir, ferir, punir, mesmo que todas aquelas pessoas que morreram fossem más, a “justiça que vemos em Deus é justiça que vemos executada na morte de Jesus em “favor”, e não contra a humanidade pecadora”[4].

A Bíblia nos mostra um Deus que sofre com a humanidade, e não um Deus alheio, que governa tudo de longe, mas um Deus que participa e partilha o sofrimento e as aflições de seu povo. Creio que no dia 26 de dezembro de 2004, Deus estava sofrendo ao lado daqueles que sofriam, pois, Deus na sua soberania tem liberdade para partilhar a fraqueza e o sofrimento do ser humano.
Portanto, acredito que é esse o tipo de teologia que responde as nossas perguntas. Ao contrário da doutrina tradicional especulativa da soberania de Deus, que nos leva a ser ainda mais alienados dos que sofrem, essa nos desafia e nos faz refletir com mais seriedade sobre as nossas atitudes em relação ao mundo e as pessoas que sofrem.

[1] Shirley C. GUTHRIE. Sempre Reformando, p. 99.
[2] Shirley C. GUTHRIE. Sempre Reformando, p. 100.
[3] Shirley C. GUTHRIE. Sempre Reformando, p. 105.
[4] Shirley C. GUTHRIE. Sempre Reformando, p. 109.




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